quarta-feira, 1 de julho de 2009

MANIFESTO POR OUTROS SONHOS POSSÍVEIS

À Militância da Tendência Marxista do Partido dos Trabalhadores – Parte 2

“O desacordo entre o sonho e a realidade nada tem de nocivo se, cada vez que sonha, o homem acredita seriamente em seu sonho, se observa atentamente a vida, compara suas observações com seus castelos no ar e, de uma forma geral, trabalha escrupulosamente para a realização de suas fantasias.”

(Lênin cita Pissarev em “O que fazer?”)

A edificação do Partido dos Trabalhadores deu-se como novidade no cenário do fim da ditadura militar e a retomada histórica da democracia formal no Brasil. Com um programa político de contestação ao status quo, combativo e classista, engajado em amplos movimentos sociais, referenciado numa concepção socialista, popular e democrática, o PT nasceu como instrumento de organização do povo explorado. Sob a bandeira da estrela cresceu a referência de massas e se somaram inúmeros militantes devotados e voluntariosos de diversas matizes ideológicas.

É imprescindível saber de onde viemos e o que buscamos. Somos parte desta história. Somos herdeiros das lutas proletárias em todos os países. Somos frutos dos cárceres e dos martírios por toda América. Quando o PT surgiu, muitos de nós já caminhávamos nas lutas e sofríamos perseguições. Não era fácil se afirmar “petista” naqueles tempos. Mas persistimos, dedicamos anos de paciência cuidadosa para forjar o PT enquanto um referencial poderoso em meio à guerra das classes.

Quando prevaleceu o mesmo velho desencanto revisionista, na embalagem de uma suposta “nova esquerda”, preferimos sonhar e tornar o sonho possível. Sustentamos princípios e reinventamos a nós mesmos enquanto movimento. Movimento por uma Tendência Marxista. Sabíamos dos riscos da pretensão auto-proclamatória, mas também sabíamos que o mais importante era o conteúdo que afirmava e não o seu rótulo.

“A TM é uma corrente revolucionária definida filosoficamente pelo marxismo, entendido como corrente crítica, revolucionária e humanista. Entende que o ser humano é um ser da práxis, sobre a qual se funda o próprio processo de humanização. Acredita na capacidade teleológica da subjetividade humana, nas condições exteriores que se lhe apresentam, de recriar a objetividade social sem a ela render-se. A sua opção pelo marxismo não se dá como simples referência, mas pela incorporação de um conjunto de valores, além de um fundamento teórico-filosófico. Reconhece-o como teoria, cultura e patrimônio político-ideológico do movimento proletário.” *

De lá prá cá, o PT e a esquerda brasileira disputaram e conquistaram posições destacadas no âmbito da institucionalidade vigente, com alguns mandatos e governos que trouxeram as marcas da ousadia e da honestidade na gestão pública. Outros nem tanto.

Programas como o Orçamento Participativo, bolsas e medidas compensatórias ingressaram no imaginário popular como o “modo petista” de administrar. A agenda inverteu-se e perpassa a impressão que aos revolucionários restou um papel de resistência nas trincheiras dos movimentos sociais.

Resistimos às tentativas de retirada do caráter socialista original do PT, embora não se tenha avançado no que significa tal “socialismo petista”. Resistimos ao fim do direito de tendências e às expulsões esquerdistas, enquanto testemunhamos sucessivos rebaixamentos programáticos até o ápice com a “Carta aos Brasileiros” o atestado de “bom comportamento” do Campo Majoritário do PT à burguesia transnacional. Resistimos ao fim dos núcleos e vimos crescer vertiginosamente a burocratização das instâncias partidárias. Resistimos à manipulação da democracia interna e observamos o império do estrelismo, do aparelhamento e da despolitização das contabilidades de “garrafinhas”. Resistimos ao afastamento das bases, dos movimentos sociais e notamos a degeneração das práticas por setores dirigentes.

Depois de tantos embates e recuos, agora se vislumbra a contaminação da própria esquerda partidária. Mesmo onde concepções identificadas à esquerda avançaram para dentro do aparelho estatal, é preciso admitir que prevalece uma correlação de forças pró-capital, tendo havido avanços limitados para os movimentos organizados. A permissividade entre os papéis é tão grande que há hoje quem misture propositalmente a institucionalidade do Estado burguês com a dinâmica dos movimentos sociais.

Evidentemente houve avanços também. As políticas neoliberais demonstraram seus limites. Mas a crise estrutural do sistema em curso não é potencializada para um direcionamento francamente socialista. A política de acomodação conciliadora em torno de um “capitalismo humanizado” leva o governo Lula, por exemplo, a emprestar fôlego ao falido FMI, enquanto os famintos do mundo questionam o papel dos organismos multilaterais.

Parece que alguns de nós se esqueceram do que passaram. Ou supõem que as cicatrizes do passado de combates, converteu-se num salvo-conduto agora para se renegar a própria história, suplantada pela colheita de dividendos políticos.

Será uma mera “ingenuidade” querer fazer política “sem se sujar”? Que papel cumpre uma organização revolucionária diante da crise mundial do capitalismo? Quais desafios enfrentamos para manter o PT numa linha à esquerda?

“A TM tem como propósito humano-universal a emancipação da humanidade na sociedade comunista, entendida como projeto racional de fundamento ético-ideológico, tornado possível pela própria existência objetiva das formações sociais burguesas, com suas leis e necessidades. Trata-se de um propósito que, posto pela história, poderá ser objetivado na práxis revolucionária. Assim, rejeita as noções, tanto de que o socialismo é uma simples decorrência da evolução orgânica das relações de produção capitalistas, quanto de que é apenas uma utopia ou referência moral. Afirma como tarefa central a luta pelo socialismo, concebido como possibilidade de transição dentro de uma situação histórica concreta.” *

A reestruturação produtiva do capital em andamento desloca a centralidade das lutas do mundo do trabalho para outras esferas da vida cotidiana. A diversidade das pautas e bandeiras redefine, num amplo “movimento de movimentos”, os espaços das lutas renovadas que se materializam no Fórum Social Mundial e nos enfrentamentos populares contra as megacorporações oligopólicas e seus organismos financiadores e regulatórios, como o Banco Mundial e a OMC.

Surgimos da necessidade de manter acesa a chama de alguns princípios, como: a difusão dos valores da emancipação humana, da lealdade e da fraternidade; a defesa da revolução socialista; o combate à exploração e à opressão capitalista e latifundiária; o estudo e a formação teórica e política; a solidariedade e luta ao lado de perseguidos(as) pela reação política, entre outros. São princípios para não se subordinar aos conchavos e às mutretas da velha conhecida pragmática do peleguismo de resultados, sob a égide do discurso pseudo-esquerdizante.

Somos parte da continuidade da luta revolucionária no Brasil e no mundo. Não somos neófitos, nem desconhecidos dos que lutam. Construímos uma reputação de combatividade nas bases: nos movimentos sindical, popular, estudantil, enfim, nos movimentos sociais, para fortalecer um projeto de transformações radicais.

A par das vitórias, infelizmente o que observamos, no entanto, são inúmeros desvios. Poderíamos guardar diferenças de concepção e construção política com setores ditos “moderados do partido”. Mas o que se verificou foi a degeneração de um setor que expôs o PT à desmoralização pública.

A denúncia da existência da “infiltração” de práticas oportunistas mesmo na esquerda partidária, nem sempre encontra respaldo na crítica e na punição exemplar, mas resulta em condescendência, corporativismo e até a perseguição aos denunciantes. A desculpa é o rebaixamento do horizonte organizativo: as regras existem mas ninguém as segue.

Hoje assistimos decepcionados à liqüidação da organicidade enquanto tal. Não por nossa vontade e consentimento, muitas vezes nos encontramos sem capacidade de direção política, longe da base e à mercê de interesses particulares. Nota-se que o discurso político não corresponde à prática e prevalece a degeneração e o oportunismo.

A verdadeira democracia operária é incompatível com a ausência de regras e da qualidade na construção de seu conteúdo político. Sem isso, é um ritual de confirmação ou um simulacro para referendar o que está imposto. Ante o consenso subalterno e personalista, preferimos a ousadia original e coletiva das cabeças pensantes.

Não se trata de uma cruzada moral ou mesmo de um apego a um formalismo exacerbado. Não nos achamos perfeitos e infalíveis. O exercício da crítica é parte do debate que sempre propugnamos.

Trata-se, isso sim, de qual concepção de organização defendemos. Qual tipo de sociedade pretendemos construir e de qual Revolução estamos falando? Se vale tudo na luta pelo poder então quais são os princípios que balizam a causa que construímos?

“Os militantes têm o dever de: difundir os valores da emancipação humana, defender a revolução socialista e aplicar a política deliberada pelo coletivo; combater a exploração e a opressão capitalista e latifundiária; trabalhar pela construção da TM e do PT, convidando novos combatentes para participar da esfera orgânica; comunicar às suas instâncias as informações relevantes à sua disposição, relativas à política e às frentes de atuação da Tendência, mesmo em acontecimentos nos quais estejam envolvidos informalmente, assim prevenindo ou corrigindo erros políticos e potencializando a atividade coletiva; relacionar-se individualmente com o coletivo, e não através de grupos com interesses ou plataforma próprios; desenvolver a lealdade e a fraternidade, desestimulando a intolerância, o sectarismo e a intriga; estudar e procurar desenvolver a sua formação teórica e política; prestar solidariedade e lutar ao lado dos perseguidos pela reação política...” *

Vamos continuar resistindo onde sempre estivemos: não nos desviamos da chama inicial que iluminou nossos passos. A solidariedade generosa dos trabalhadores organizados é o nosso lar. Não estamos à venda por cargos ou benesses. Tampouco estamos aí fazendo o jogo patronal e eleitoreiro. Vamos continuar nossa marcha pelo caminho socialista. Em meio às facilidades do senso comum anticomunista, afirmamos, inversamente, a defesa dos valores da fraternidade revolucionária e da partilha em comunidade.

É preciso avançar. Acreditamos no marxismo não como um tratado dogmático e imutável, e sim como teoria da ação transformadora. Um fundamento que não estacionou no tempo, mas que se mantém atual como crítica da economia política e como método do materialismo histórico e dialético.

Este é um convite à luta. Convidamos os autênticos lutadores do povo a se somarem neste resgate dos princípios que sempre pautaram nossa história. Convidamos a militância a reverter a letargia paralisante em ações revigoradoras da práxis que anima nossa ânsia em tornar os sonhos possíveis.

Em virtude dos últimos acontecimentos verificados na nossa organização é que estamos juntos na luta de resistência, em defesa de nossos regulamentos e princípios, construindo uma Conferência de quem acredita no marxismo autêntico e numa perspectiva revolucionária.

Fortaleza, 30 de maio de 2009

*trechos da Resolução sobre o Funcionamento Interno da TM, aprovada em Conferência Nacional em 2000.

Assinam:

Adriano Torquato – tecnologia da informação, Aíla Maria Marques – professora, Ana Jaqueline R. Lins – mulheres, Ana Paula N. Lopes – professora, Ana Valéria Holanda – ambientalista, Andréa Peixoto G. Aguiar – assistente social, Antonio Arilo da Silva – agrônomo, Antonio Carlos Alberto A. Amaral – servidor público, Antonio Ibiapino da Silva – radialista, Antonio José Silva – popular, Antonio Ribeiro Neto (Cabo Osório) – comerciário, Antônio Sales de Sousa – comerciário, Antonio Terto – popular, Arline Nobre – mulheres, Carlos Emanuel B. Alves – juventude, Carlos Henrique C. dos Santos – operário têxtil, Cícero Correia Lima – comerciário, Conceição Maria V. de Lima – popular, Cristiane C. da Silva – juventude, Diana de Sousa – popular, Domingos Braga Mota – comerciário, Dorisval de Lima – bancário, Edilene Sales – professora, Emanuel M. Vieira – professor, Emília Maria L. da Silva – professora, Erbênia Maria Girão – professora, Eugênio Pacelli F. de Araújo – professor, Fernanda Cavalcanti – professora, Francisca Robéria Peixoto – ambientalista, Francisca Elzenita Alexandre – professora, Francisco Carlos B. dos Santos – metroviário, Francisco Estevão Rodrigues – juventude, Francisco Fábio M. Queiroz – radialista, Francisco Flademir B. Castelo Branco – professor, Francisco Mairton Freire – operário têxtil, Francisco Tiago F. do Nascimento – juventude, Helenice Pereira – comerciária, Ivanilde Santos – comerciária, João Batista Costa – vigilante, João Ferreira da Silva – popular, João Ferreira Melo – operário têxtil, José Edson P. de Sousa – vigilante, José Newton C. Júnior – agrônomo, José Nilson R. do Nascimento – comerciário, Josymary Vitoriano – professora, Juvimário A. Moreira – juventude, Lílian Macena – juventude, Luana Marques – juventude, Luis Carlos Macêdo – servidor público, Luiz Belino F. Sales – geógrafo, Manoel Neto A. Maciel – estudante, Márcio Roberto P. Alves – professor, Marcus Diogo da Silva – tecnologia da informação, Maria do Socorro Rodrigues – mulheres, Maria Elaini M. Lustosa bibliotecária, Maria Eliete L. Sousa – popular, Maria Letícia C. Santos – mulheres, Mírian Amaral Ferreira – mulheres, Mozart P. de Mesquita Filho – zelador, Murilo da Rocha Paz – comerciário, Nelson Régis R. Maia – operador de áudio, Pedro da Silva Bezerra – operário têxtil, Rafael Tomyama – ambientalista, Raimundo Ivan B. da Silva – comerciário, Raimundo Muniz Mendes – operário têxtil, Raimundo N. Jerônimo de Oliveira – operário têxtil, Raul A. Monteiro Jr. – psicólogo, Raulene Gonçalves – ambientalista, Rômulo Diógenes S. Bezerra – operário têxtil, Rosemary Batista Maia – popular, Rutenes Fernandes – servidor público, Rutilene Oliveira – comerciária, Sílvia H. Guimarães da Silva – mulheres, Sinval F. da Silva – comerciário, Sônia Holanda R. da Costa – professora, Talve Johnson M. Façanha – vigilante, Tarcísio Jerônimo do Nascimento – operário têxtil, Terezinha de Jesus A. Maciel – professora, Vânia Silveira – juventude, Vicente Pinto – metroviário, Wellington Nascimento de Oliveira – vigilante, Zózimo Farias Filho – educador


(aberto a adesões)

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