quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

LEVANTA, SACODE A POEIRA...

EM DEFESA DE NOSSOS VERDADEIROS VALORES E PRINCÍPIOS

As postagens que seguem constituem um documento de balanço político da nossa ação partidária no último período e de estabelecimento das perspectivas gerais para nossa atuação militante em 2010

“Crise de hegemonia é quando o novo ainda não terminou de nascer
e o velho se recusa a morrer” A. Gramsci*


O PT como conhecemos e ajudamos a construir está desaparecendo. O PT das lutas e de lutadores(as) do povo está sendo destruído. O PT que nasceu das barricadas pelas liberdades democráticas, das bandeiras renovadas da combatividade e das caminhadas populares por nossos ideais, pão, terra e liberdade está dando lugar ao pragmatismo político. O PT da oposição ideológica ao sistema assumiu sem medo a disputa pelo poder para transformá-lo e acabou transformado num ser adaptado à ordem. Por nossas mãos, inclusive, enveredou pelo labirinto do minotauro.

Como nos ensina a dialética, há sempre algo florescendo em meio ao que se acaba. Somos parte do que se acaba e do que recomeça. Somos também o minotauro que perseguimos e que nos persegue. Residimos na contradição e a contradição reside em nós. É nossa tarefa distinguir o que é fundamental conservar e o que é imperioso mudar.

ANTECEDENTES

Para elaborar uma crítica ao processo em curso no Partido, é preciso destacar alguns elementos que se evidenciaram no cenário e do qual tomamos parte. A tomada de assalto da organização que antecedeu ao PED está inserido no contexto maior de crise da esquerda como um todo. A fragmentação e saída de levas de militantes do partido é um indicador da falta de perspectivas organizativas que apontem conteúdos e práticas que efetivamente se materializem no sentido da superação do capitalismo.

Mesmo assim, a militância do Coletivo Marxista encabeçou lutas históricas nos movimentos populares e nas categorias organizadas. No movimento sindical, por exemplo, construímos o resgate do Sindicato dos Vigilantes para luta, formamos chapa própria para eleição do SINDIUTE (professores(as) do município) e crescemos no reconhecimento da categoria ao denunciar as fraudes no seu processo eleitoral, fizemos parte da conquista comerciária da lei do direito ao descanso semanal aos domingos, mantivemo-nos na direção da CUT-CE e vencemos a batalha política em torno da direção do Sindicato dos Servidores Públicos Federais. Crescemos ainda na juventude, nos bairros e nos movimentos ambientalista e de mulheres, participando das Secretarias Setoriais do PT. Conquistamos e nos mantivemos como referência na mesa diretora do Conselho Estadual de Saúde.

Diante do quadro de desmonte organizativo, estabelecemos uma tática reativa para preservar nossos espaços e objetivos. Esta tática definiu a prioridade em torno das disputas em 2010, considerando a Executiva Estadual do PT e a candidatura de Ibiapino a Deputado Estadual. Além disso, buscou manter uma construção em aliança com forças da esquerda partidária no plano local, e posicionou-se também numa perspectiva de construção pela esquerda no plano nacional.

É preciso que neste balanço, mais do que identificar os elementos que levaram ao sucesso ou não desta tática, procuremos estabelecer as bases para sua rápida superação, pois, como dito, ela foi implementada num momento difícil, face aos acontecimentos que se verificaram no primeiro semestre de 2009 e que levaram à divisão da nossa antiga corrente.
BALANÇO DO PED

No geral, o resultado do PED não foi muito satisfatório para a esquerda partidária. No plano nacional, a diminuição sucessiva da esquerda nos últimos embates corresponde ao domínio do chamado “campo democrático”, agora recomposto nas suas inúmeras facções de interesse, em torno da defesa intransigente do governo Lula e da candidata Dilma.

A esquerda partidária tem colaborado pouco para chegar a formulações que se contraponham como alternativas políticas ao discurso majoritário da conciliação e que incidam decisivamente sobre a dinâmica partidária. Ao contrário, verifica-se a proliferação de práticas que levam cada vez mais a subordinação do PT à deformação oportunista.

O processo de rebaixamento programático, burocratização e estrelismo, que sempre denunciamos, contamina o conjunto do Partido, inclusive os grupos que se dzem da “esquerda partidária”. O caciquismo escandaloso e desavergonhado descamba para a manipulação, fisiologismo e até compra de votos e de lideranças.

Neste contexto, à esquerda parece estar reservado um papel marginal e meramente referendador de políticas de direita empurradas goela abaixo. E ainda legitimando com um verniz de “esquerda”, enquanto vêm à tona práticas abomináveis. Um programa capaz de unir planificação econômica, democracia e liberdades individuais nem é considerado dentro da pauta dos debates.

O processo de definição das candidaturas no PED, por exemplo, evidencia a inversão na relevância de papéis das lideranças partidárias. Os detentores de cargos públicos, nomes construídos coletivamente pelas bases, não raro com o discurso da participação democrática, sentam-se ao redor de uma mesa e tomam as decisões, repartem o bolo da partilha das benesses e das intimidações. Dali saem para a “contagem dos votos”. Cabem às bases devotas referendarem os acertos e desacertos dos líderes. Não são mais dirigentes e militantes conscientes e sim patrões e empregados.

No Ceará, embora o grupo majoritário da direita partidária tenha se mantido à frente, mesmo que um pouco menor, seu peso na composição das estruturas ainda é decisivo. Esta impressão se reforça pela divisão entre os aliados que lhe contrapunham, embora seus métodos atrasados de disputa tenham se proliferado como regra e não causem surpresa. As lideranças se omitem e se adaptam facilmente aos fins que pretendem justificar os meios e viciam a militância na espiral da troca de favores.

De que projeto político se trata? Não há ou não se mostra, envergonhado de si próprio. A despolitização e a imposição das estruturas financeiras constituídas por quem as controla, para garantir o “estamos juntos” oco e sem forma – ao invés de saída de radicalização das lutas torna-se uma adaptação indefinida ao status quo.
LIMITES E POSSIBILIDADES

Neste quadro, o nosso esforço sincero para manter unidas as forças do campo “Esperança Socialista”, que construímos com abnegação durante um bom tempo, foi insuficiente. As motivações que resultaram na nossa ruptura interna também influíram sobre o cenário geral e acabaram por nos posicionar de forma diversa. Infelizmente, não por nossa vontade, a diretriz de manter a unidade do campo foi rompida pelo imediatismo da reprodução de interesses pessoais. O que é indicador de um erro político maior, a ser evidenciado pelo tempo.

Mesmo no campo remanescente, há tensionamentos conjunturais que dificultam a efetivação da unidade. Entretanto, a nossa abertura para uma reorganização pode nos colocar numa posição de foco de iniciativas orgânicas positivas. Há o interesse em manter um canal de diálogo com várias forças que atuam no partido no Ceará. Devemos acompanhar atentamente os desdobramentos dos debates.

No balanço final, mesmo com o resultado ainda pequeno no interior, há uma valorização da importância do trabalho lá e das novas frentes se abrindo. Garantimos a preservação de nossa posição na direção estadual e cumprimos a meta esperada na capital. A par de alguns esforços decisivos em alguns setores, devemos admitir que a atuação de boa parte do nosso grupo no PED em Fortaleza revelou-se dispersa, desorganizada e ineficiente. Mesmo assim, cumprindo em torno de 60% da meta estabelecida pela chapa, nos mantivemos com um saldo razoável, frente ao quadro geral de quebras em todas as forças.

Diante desse quadro, como devemos atuar?

O PT segue sendo a grande referência para a massa trabalhadora. Mais do que isso, as políticas diferenciadas emanadas dos governos populares, em especial do governo Lula, atingem milhões de pessoas. Isto é, a ascensão social de parte significativa do mundo do trabalho passa por políticas governamentais, operadas por dirigentes identificados com a insígnia petista. A esquerda tem que ter em mente, em que pesem desconfianças setorizadas, que as famílias e círculos de convivência do povo trabalhador, estão em contato permanente com o imaginário e a materialidade das inversões de prioridades que tem a cara do PT como norte político.

Reconhecer isso, por outro lado, não pode corresponder à perca do senso crítico. Os limites reformistas das medidas compensatórias estão evidentes, pois não permitem o acúmulo de forças para a luta emancipatória do proletariado e se restringem ao endeusamento populista das celebridades e à reprodução indefinida no poder.

Se a melhoria das condições gerais de vida do povo podem resultar no aumento do conservadorismo, na medida em que desejam manter a melhoria no seu patamar de sobrevivência, contraditoriamente, aumenta a insatisfação e a consciência de classe, ao se depararem com os limites das possibilidades capitalistas. Assim sendo, cabe, ou caberia, ao partido de trabalhadores(as) não abrir mão da disputa de hegemonia ideológica e a organizar o meio popular para a intensificação da combatividade em torno de bandeiras concretas, como por exemplo: a redução da jornada de trabalho sem redução salarial, a implantação do piso docente e pela equiparação das aposentadorias.

É preciso estabelecer uma estratégia política que reverta o papel secundário da esquerda autêntica na direção partidária. E isso se faz com investimento no trabalho de base com formação política. Isso é possível com uma inserção decisiva nos movimentos sociais, com a construção de alternativas de emprego, renda e sociabilidade.

Não há outra saída viável. Ou nos atiramos nestas tarefas políticas ou estamos fadados a virar parte do folclore empalhado em algum lugar no passado. É preciso combinar a luta social de massas com instrumentos de propaganda e agitação política. São enormes os desafios colocados e não será tarefa de um único coletivo de abnegados. É preciso uma articulação mais ampla e generosa que coloque a perspectiva socialista de volta ao foco.
TAREFAS POLÍTICAS IMEDIATAS

Este é mais um ano pautado pela agenda eleitoral. A questão envolve não só o posicionamento no Partido do Ceará, mas o desafio colocado na disputa no âmbito nacional. Derrotar a retomada do neoliberalismo tucano-democrata é estratégico para as possibilidades de aprofundamento de avanços anticapitalistas no Brasil. É preciso, no entanto, que a candidatura do PT e a frente de coalizão que a acompanha, assumam compromissos históricos em torno de avanços programáticos crescentes.

Neste sentido, é preciso que a militância (e não somente a direção) realize um balanço realista sobre o significado do “grande salto”, propugnado pela aliança com o PSB e os espaços que o PT ocupa nesta aliança. É preciso que sejam constituídos compromissos evidentes com os interesses democrático-populares. Por isso, não pode haver nenhuma concessão ao PSDB de Jereissati & Cia. e a apresentação da candidatura do PT ao Senado é parte fundamental desta tática.

Além disso, nossa corrente está apresentando a candidatura do camarada Antônio Ibiapino a Deputado Estadual. É muito importante o envolvimento de toda militância, simpatizantes e amigos(as) do Coletivo Marxista para defesa desta que se constitui numa alternativa operária para o parlamento no Estado. Ela representa a materialização do projeto ideológico coletivo que defendemos. A prova viva de que é possível fazer política sem concessões ao modo de fazer burguês.

Para o sucesso de nossa iniciativa é imprescindível a constituição de alianças com candidaturas petistas ou do arco de forças que mantenham identidade com o projeto original do PT em torno da candidatura Dilma. Mais do que isso, a chave da vitória está na configuração de um amplo movimento de resistência ideológica em defesa de valores e princípios que orientam nossas lutas e da qual nossa candidatura é herdeira e representante. Nossa candidatura deve servir como instrumento e inspiração para inúmeros(as) lutadores e lutadoras do povo que se disponham a abraçá-la.

Por fim, uma tarefa política igualmente importante está na realização da Conferência do Coletivo Marxista, prevista para março, após o Congresso Nacional do PT, onde também deveremos estar presentes para reforçar nossa articulação nacional. Este será um ano de muita atividade política e devemos ter clareza sobre nossa identidade e os rumos a seguir. Se é certo que há muitas indefinições adiante é preciso traçar cenários e avaliar os próximos passos da nossa caminhada incansável rumo ao Socialismo.
CONCLUSÃO

É preciso sabedoria para enfrentar o senso comum do maniqueísmo. Nem tudo que é novo, vem necessariamente para o bem. Nem tudo que é antigo deve ser obrigatoriamente descartado. Mas é preciso também saber que não há como deter a roda inevitável da história. É preciso movimentar-se com eficiência e precisão para construção permanente do socialismo.

O jogo não está perdido, felizmente, apesar do cenário adverso. Provavelmente não há como se recuperar o sentido de construção histórica do nosso Partido, mas é possível atuar com muito mais força dentro de um novo cenário para canalizar os sentimentos de quem pensa como nós. Para vencer o desafio é preciso além de paciência e obstinação, a vontade inquebrável de homens e mulheres que lutam e sonham com as causas improváveis, mas que acabam por se tornar reais.

Coletivo Marxista
Texto aprovado em plenária da militância
3 de fevereiro de 2010


“Se as coisas são inatingíveis... ora! / Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos se não fora / A mágica presença das estrelas!”
M. Quintana**



* Antonio Gramsci, intelectual comunista italiano do início do século XX
** Mário Quintana foi jornalista e poeta brasileiro no século XX