5. CONJUNTURA POLÍTICA5.1. No Mundo:
Os povos do mundo vêm sendo assolados por crises cíclicas profundas do capitalismo. Não se tratam de novas crises conjunturais, mas do afloramento da sua insustentabilidade estrutural: crise hipotecária e financeira norte-americana, queda da bolsa, alta do dólar e dos preços do petróleo e alimentos, fracassos sucessivos das rodadas de negociação ambientais e comerciais, conflitos étnicos, separatistas e guerras, entre outras.
A humanidade atravessa o dilema em torno da sustentabilidade, que ameaça a permanência da sua existência e de outras formas de vida no planeta. Mudanças climáticas, desertificação, insegurança alimentar, falta de água potável, neuroses e outras doenças, caos urbanos, são apenas diferentes expressões deste mesmo fenômeno. A discussão fundamental por trás disso é a dos modelos de desenvolvimento. A sustentabilidade sócio-ambiental tem que entrar como uma variável estrutural dos paradigmas de produção e consumo, com democracia participativa.
Nas sociedades antigas, quando os humanos ensaiavam os passos da organização em sociedade, de um sistema de escambo em que viviam, com o surgimento da propriedade privada e conseqüente exploração do trabalho dos humanos entre si e sobre a natureza, surgiu a necessidade da moeda. Ao longo da história, de mediadora das trocas de mercadorias, a moeda ganhou autonomia, passando a fazer parte das relações de produção e permear todas as dimensões da vida cotidiana. No estágio em que o capital adquire a forma de produção capitalista, chega-se ao extremo de hoje mercantilizar não só o mundo material, como interferir nas subjetividades da sociabilidade humana.
Nesta sociedade da produção industrial e do consumo de massa, os valores sociais são afirmados e rapidamente repostos. O retorno dos investimentos capitalistas advindo da exploração do trabalho e acúmulo da mais-valia tem sua rentabilidade materializada na esfera da circulação das mercadorias. São os ganhos crescentes de capital que possibilitam a implementação ascendente da automação tecnológica, beneficiando as grandes empresas em detrimento das pequenas e médias, o que produz as crises: do desemprego estrutural, da superprodução com escassez de crédito, da falta de alimentos, das mudanças climáticas, etc. É a concentração de enormes volumes de poder e capital em mega corporações oligopólicas transnacionais que passam a controlar setores estratégicos das urbes, como: fornecimento de água e alimentos, fontes de energia, redes de transportes e comunicação, etc.
Assim sendo, cabe à superestrutura a indução de uma atmosfera de exacerbação do consumo. Neste mundo dominante materialista, da produção em série,
standartizada, são reproduzidos valores igualmente pasteurizados e descartáveis. Tais valores se inserem no cotidiano das relações afetivas, na vulgarização sexista, utilitária e psicótica do sensacionalismo e da banalização da violência. É um mundo fetichizado, alienado e anestesiado pela perspectiva do consumo incessante do simbólico. Fustigado por abismos de desigualdade social que opõem a “inclusão” no mercado das grandes cadeias comerciais à marginalidade pedinte ou bandida. A dicotomia da opulência e da miséria compõe a paranóica microfísica totalitária das câmeras de vigilância, do controle generalizado, da paradoxal redução gradativa da individualidade para dar suporte ao individualismo.
Sabe-se que a sustentabilidade é incompatível com a lógica da produção e consumo capitalistas. Isso não quer dizer abrir mão dos espaços de disputa na sociedade, em torno de um projeto viável de sustentabilidade rural e urbana. É preciso discutir a cidade e o campo que sonhamos e queremos, ou seja, discutir um outro modelo possível de campo e cidade sustentáveis.
A unidade entre cidade e o campo sustentáveis pressupõe uma concepção renovada de desenvolvimento com equilíbrio e distribuição de renda. Ela estabelece uma relação responsável com seus habitantes, em torno das bases legais que ordenam o desenvolvimento rural e urbano.
Ela se assenta sobre um planejamento integrado da expansão territorial, respeitando as particularidades locais e o interesse social das comunidades. Enfim, ela parte da superação da lógica restritiva da habitação vinculada exclusivamente ao mercado imobiliário, e vai ao encontro do significado da habitabilidade abrangente: moradia, saúde, saneamento básico, qualidade de vida, emprego e renda, etc.
Assim, a sustentabilidade acontece não isolada do mundo, como um oásis em meio ao deserto, mas dentro de uma concepção de responsabilidade mundial com a preservação do planeta e continuidade da existência das futuras gerações. Diante da crise estrutural que atinge a humanidade, a perspectiva emancipatória implica numa ação socialista radicalmente comprometida com a democracia, com a igualdade de direitos, com o respeito à diversidade e com o desenvolvimento equilibrado, social e ambientalmente justo. Isso não será obra de uma ruptura histórica pontual e sim de um trabalho de acúmulo e correlação de forças que favoreça a hegemonia da classe trabalhadora.
5.2. Na América Latina:
A América Latina, assim como o restante do planeta, passa por enormes transformações sociais, políticas e ambientais, decorrentes da reestruturação produtiva do capital e sua incidência no mundo do trabalho.
A crise financeira que atinge os EUA é fruto dessas mudanças que ocorrem ao redor do mundo. A política estadosunidense para a livre distribuição de suas mercadorias vem sendo um fator de instabilidade na América Latina. A política de hostilidades crescentes foi amplamente derrotada pelos insucessos da Área de Livre Comércio das Américas e das empreitadas militares no Iraque e no Afeganistão.
Ao mesmo tempo, a eleição de Lula no Brasil marcou o ciclo de vitórias de um campo à esquerda: Argentina, Venezuela, Equador, Chile, Bolívia, Uruguai, Paraguai entre outros. É necessária uma melhor articulação para combater a reação da direita, a exemplo do que ocorre no Chile, Honduras e contra Chávez na Venezuela e para consolidar a hegemonia de uma nova visão política, econômica e ecológica para o continente.
Só a defesa de um projeto socialista internacional democrático e sustentável possibilitará avanços cada vez maiores contra o capitalismo, responsável pelas crises econômicas e pelos graves problemas do mundo contemporâneo.
5.3. No Brasil:A História oficial ocidental na América trata de mais de 500 anos de exploração, degradação e massacre de povos índios e negros escravizados. A história da rapina e conquista do Brasil pelos brancos, desde a Colônia, passando pelo Império até a República foi escrita à sangue. Sempre no papel de subordinação econômica na divisão internacional dos mercados, prevalece o caráter exportador de riquezas em natura, pouco manufaturados e de baixo valor agregado. Mesmo quando o país chega atrasado à era capitalista, migrando o eixo econômico e político do nordeste para o sudeste, permanece o domínio oligárquico nos negócios privados. Assim, coube a um inchado Estado patrimonialista o papel indutor de um crescimento econômico assentado sob bases oligopólicas multinacionais.
Depois das tentativas iniciais de organizar o povo trabalhador e conquistas crescentes que poderiam levar a um projeto de desenvolvimento com soberania nacional veio o golpe militar de 1964. Até a metade dos anos 1980, pessoas e organizações populares e da imprensa viveram um processo brutal de censura, perseguição e desmantelamento. Combinando um certo protecionismo ufanista com a livre expansão do capital internacional, o regime totalitário de direita acabou naufragando diante da crise econômica, da astronômica dívida externa e das pressões crescentes interna e externamente quanto à liberdade de expressão e aos demais direitos democráticos.
Em seguida veio a redemocratização resultante de inúmeras lutas, em que se deu a reorganização dos movimentos sociais e a fundação do PT e da CUT. Mas a direita também recompôs em torno de seus interesses econômicos. Sarney, Collor, Itamar e FHC foram representantes de frações atrasadas e corruptas da classe dominante.
Fernando Henrique a seguir, surge como paladino de um projeto burguês pretensamente superior: o neoliberalismo. A teoria neoliberal afirmava o papel auto-regulador dos mercados e sem a interferência do Estado. Sob a bandeira da “globalização do mercado” praticou-se uma política de superexploração do trabalho, com arrocho salarial, demissões e ameaças crescentes aos direitos trabalhistas. Sob os oito anos de governo tucano houve o desmonte das estatais e privatizações do patrimônio público. Sucatearam-se universidades e escolas técnicas, inibindo o potencial de pesquisa e desenvolvimento tecnológico do país. Até a soberania nacional foi afrontada pela implantação da base norte-americana no Maranhão e a adoção do sistema ianque de monitoramento da Amazônia. Enfim, FHC constituiu-se num desgoverno corrupto, marcado pelo apagão elétrico e que, sob o manto da “responsabilidade fiscal”, massacrou o povo trabalhador, suprimiu a perspectiva de projeto de integração e desenvolvimento nacional e quebrou o país. Duas vezes.
Entretanto, houve também ao longo de todo este período, movimentos de resistência das organizações populares, dos partidos de esquerda, das pastorais sociais e das igrejas progressistas, das entidades estudantis, do MST e da agricultura familiar e dos sindicatos da CUT. Desde as “Diretas Já”, passando pelo “Fora Collor”, pelos plebiscitos da dívida externa e da ALCA, até as marchas à Brasília e os Fóruns Sociais Mundiais, os movimentos sociais protagonizaram ações políticas e de massas que se contrapunham à globalização do capital em curso.
Em 2002, a eleição de Lula Presidente, de certa forma é herdeira desses movimentos. Mesmo considerando as limitações inerentes ao processo de administrar o capitalismo e a concepção reformista e de conciliação de classes e as deformações morais, presentes no campo majoritário do PT, há que se identificar avanços nas políticas públicas em relação aos governos anteriores da burguesia. O governo Lula, de inspiração democrático-popular, partiu da premissa da institucionalização articulada de programas sociais e de melhorias quanto à democracia participativa. Ele promove a reestruturação e organização do Estado nacional, uma política ativa de trabalho e emprego, a melhoria na distribuição de renda e na segurança alimentar e o acesso à educação superior e ao crédito para investimentos na cidade e no campo. E mesmo sem a mesma prioridade no atendimento aos interesses dos mercados, os capitalistas resguardados pela “Carta aos Brasileiros” não têm o que reclamar, vide lucros dos bancos e do agronegócio. Mas as representações dos(as) trabalhadores(as) encontram um campo mais favorável para pressionar e negociar suas condições de trabalho e renda.
A estabilidade econômica e da balança de pagamentos, o controle austero dos juros e do câmbio, a abertura de novos acordos e mercados adequados ao perfil agrário-exportador, o saneamento de empréstimos internacionais, aliada às políticas desenvolvimentistas de financiamento e incentivo e a recuperação parcial do potencial de compra do salário mínimo, ampliaram o mercado interno.
A bem da verdade deve-se considerar que as possibilidades de avanços estão restringidas pela tese da “governabilidade”, que mantém um projeto de enorme força e aceitação popular refém do fisiologismo e das velhas manobras dos interesses oligárquicos. Esta coalizão entre projetos antagônicos, típica do colaboracionismo de classes, favorece a manutenção do assistencialismo e o paternalismo, o personalismo e o populismo. Além de confundir as massas, mantém as possibilidades do avanço político consciente e organizado dos movimentos sociais restritos à agenda da institucionalidade.
Por isso é preciso potencializar o PT como força propulsora da organização e da formação da classe trabalhadora como motor da história. Nosso conteúdo político e nossa prática cotidiana devem se contrapor ao discurso do reformismo de que é possível resolver os problemas do povo através unicamente de ações institucionais. Cabe ao PT preparar o povo como sujeito da história, na vanguarda das lutas atuais e futuras da classe trabalhadora.
Mesmo com essas preocupações, defender a trincheira atual é estratégico para continuidade do aprofundamento do projeto democrático-popular, na direção da eqüidade de direitos, justiça social e sustentabilidade. O capital se prepara para despejar um rio de dinheiro na disputa eleitoral deste ano, na tentativa de tentar retomar o domínio da situação e favorecimento de seus interesses de classe. Portanto, nossa participação organizada na eleição será de fundamental importância. Tanto para eleger a candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, como também fortes bancadas de senadores, deputados federais e estaduais.
1ª. Conferência da Tendência da Revolução Socialista / PT