quinta-feira, 8 de abril de 2010

II. Atuação da Juventude nos Movimentos

Che discursa no Congresso da União da Juventude Comunista Cubana, em 1962

A) Contexto: Juventude e Educação

23. Um quarto da população brasileira está na faixa etária de 14 a 25 anos, o que corresponde a 20% dos postos de trabalho no Brasil. De acordo com análise do perfil demográfico, até o ano de 2005, o País deverá continuar a ter mais jovens do que crianças. Segundo o IBGE, aproximadamente 80% dos jovens residem em áreas urbanas. De acordo com estudo da Fundação Getúlio Vargas, publicado em 2001, dos 50 milhões de miseráveis, 22 milhões são jovens, dos quais 15 milhões são analfabetos. Já o relatório da Unicef no mesmo ano aponta que o índice de repetência e evasão escolar em 1997 foi de 40%, na primeira série. No censo educacional de 2000, vê-se que só as repetências no ensino fundamental nas escolas públicas, chega a 11% dos alunos matriculados.

24. A Unesco mostrou que num estudo envolvendo 47 países, o Brasil paga o quarto pior salário do mundo a seus professores. Outro levantamento do mesmo órgão, com 47 mil alunos, pais e professores, em 14 capitais brasileiras, publicado no livro “Violência nas Escolas”, desmistificou a instituição como local de convivência pacífica. Dados do Ministério da Justiça apontam que quase dois terços dos presidiários brasileiros têm de 18 a 25 anos.

25. O que nos revelam estes dados? Que um grande número de jovens ingressa a cada ano na chamada “população economicamente ativa”. Entretanto, o mercado de trabalho não consegue absorve-los. A necessidade crescente de “qualificação”, e a ausência de instrução adequada e de alternativas viáveis, empurra mais ainda os(as) jovens para a marginalidade, o tráfico de drogas ou o fanatismo religioso.

26. A solução virá a partir de um trabalho dirigido a fim de cobrar do governo políticas públicas voltadas para a juventude e a formação para a cidadania. O investimento na educação e na pesquisa científica hoje é a chave para a emancipação política e tecnológica do País. Mas cabe também aos sindicatos e ao PT incluir na pauta de reivindicações, medidas que contemplem a situação do(a) jovem trabalhador(a): o acesso ao primeiro emprego, a qualificação, a permanência na escola, etc.

27. É preciso avançar ainda mais na luta por educação de qualidade. Neste sentido, deve haver a continuidade da luta na defesa de bandeiras históricas como: defender a caráter público e universal da educação; lutar pela gestão democrática nas escolas defender o direito ao acesso e permanência na escola, em todos os níveis, inclusive a educação de jovens e adultos. Exigir o aumento de verbas para a educação; lutar pela extinção da dualidade entre educação profissional e educação para a cidadania integrando os dois currículos.


B) Educação e Disputa Ideológica

28. O setor da Educação, em que pese não possa ser reduzido à esfera das instituições, se configura nesse lócus, na sua materialidade concreta. É na constituição do poder interno das escolas que se revela a crueldade da dominação capitalista implícita no aparelho de reprodução ideológico do sistema. A segregação pelo trabalho intelectual e mais especializado em detrimento do manual ou do menos especializado se reproduz na esfera das relações de trabalho. Nesta mesma lógica reificada, os alunos em geral não são convidados à descoberta do saber crítico, criativo e transformador e sim a obedecer e a repetir as “verdades” para aprovação e para submissão à sociedade tecnológica.

29. Não seria correto, no entanto, reduzir a escola e a universidade a meros aparatos ideológicos. Sem negar esta característica, o debate em torno do papel institucional no processo da aprendizagem e do surgimento do novo, tem conduzido profissionais e discentes a contextualiza-los na disputa de projetos sócio-políticos nos marcos da ordem capitalista. Ou seja, se a resposta para a superação do sistema não estão na escola e na universidade, não é tampouco desejável abandonar um palco da luta contra-hegemônica. Em outras palavras, a escola e universidade a serviço dos(as) trabalhadores(as) são uma construções que caminham par-e-passo com a luta pelo socialismo. Uma seria impensável sem a outra.

30. O Movimento Estudantil – M.E. mantém relações, no âmbito das instituições em que se desenvolve, com as direções de escolas e administrações superiores das universidades. É importante preservar a liberdade de expressão e autonomia do movimento em relação às direções dos estabelecimentos e ao Estado. É preciso encetar lutas pela ampliação da democracia nas instituições educacionais, fortalecendo mecanismo de participação e propondo a discussão do papel emancipatório da educação.

31. Tampouco deve-se guardar ilusões quanto aos conselhos escolares ou superiores (nas universidades) que via de regra se constituem em espaços democráticos limitados. Muitas vezes a participação se restringe ao referendo de decisões tecnoburocráticas ou até a apoiar gestões situacionistas fraudulentas. A manipulação dos conselhos pode levar a acomodação e cooptação do movimento. Portanto, eles têm que ser valorizados na sua justa medida: lugar de debates, intercâmbio, formulações políticas, negociação, conquistas parciais e momento de aprendizado no interior de uma ordem preestabelecida. A militância tem que privilegiar a mobilização social, a pressão direta e envolver os conselhos neste sentido.

32. Há que se compreender também a presença das ideologias dominantes na construção dos Movimentos Populares, ocasionando desvios e disputas aparelhistas que não levam à nada. Tal situação é agravada pela ausência de uma política da superação dialética da ordem capitalista pelo comunismo e da prática libertária que dela resulta. A crítica aos processos administrativo, eleitoral, metodológico, etc. é insuficiente. As instituições não estão flutuando fora do mundo real. A luta pela educação libertadora envolve a compreensão dos processos e a disputa de projetos na sociedade.


C) Particularidades do Movimento Estudantil (M.E.)

33. Sendo a construção política da organização na juventude, parte da construção dos movimentos populares, cabe pensar em que medida as características e os problemas enfrentados pelos movimentos sociais organizados guardam semelhanças com a sua construção específica.

34. Os movimentos específicos se desenvolvem nas lutas particulares de determinados setores: camponeses, juventude, estudantes, mulheres, negros, índios, idosos, deficientes físicos e de defesa do meio ambiente, da saúde e da educação, por exemplo. A atuação nesses movimentos tem que impedir o fracionamento de trabalhadores(as) em grupos mutuamente opostos. Num movimento contra-hegemônico, a articulação entre as diferentes esferas e representações do movimento popular deve se complementar e não se excluir, para que não se enfraqueçam uns aos outros.

35. No que tange ao movimento estudantil – M.E., há uma dificuldade constante em lidar com as contradições das políticas do movimento docente, principalmente. Longe de pensar no fim da autonomia dos movimentos, a construção concreta dos movimentos populares esbarra em condições objetivas para avanço da luta emancipatória: interesses corporativos, falta de boa vontade, reprodução da ideologia da “superioridade acadêmica”, etc. Está claro que a saída para superar estes impasses é uma luta articulada estrategicamente.

36. Assim como é perceptível que a disputa de pequenos espaços políticos, aparelhos burocráticos e o desprezo pela democracia têm tomado o lugar do trabalho cotidiano e da preocupação com as dimensões mais globais da luta política nas entidades estudantis. Embora a estudantada, ainda tenha até uma razoável confiança nas suas representações, para além das carteiras estudantis. O que pode ser apontado como fator agravante da crise no meio estudantil é a despolitização, a falta de forma e conteúdo político definido, a pouca clareza das direções políticas e o desinteresse generalizado pelas “guerrinhas” internas do M.E.

37. Há problemas também com a pretensão das verdades prontas e o sectarismo dogmático. Ou ao contrário, ocorre a cooptação e o oportunismo decorrentes da crise do ideário comunista e a incorporação da ideologia dominante, gerando um afastamento do trabalho de base. O distanciamento da direção e a base dos movimentos populares, produz crises de representatividade e tem contribuído para o refluxo das mobilizações. Outros aspectos são: a falta de renovação e de debate, o rebaixamento programático, o utilitarismo, a idealização e outras deformações.

38. A Juventude Marxista deve atuar na base das entidades e organizações atrasadas, mesmo em quadro político adverso, para tensionar, ocupar espaços, disputar a hegemonia e substituir a sua política. Não se deve abandona-las à direita, argumentando a sua incongruência ideológica (esquerdismo). Ao contrário, deve-se desenvolver uma ação resoluta, para não aceitar inflexões pelegas (reformismo). Para isso, as armas são: o projeto político claro e definido, sensibilidade para os limites das representações e da compreensão políticas das massas e o empreendimento da arte da guerra das classes, acumulando forças para a derrocada definitiva do poder burguês, mantida no horizonte da construção cotidiana da luta política na base.

39. Estas premissas valem inclusive com relação às disputas e atuação nas entidades estudantis de representação nacional: UNE e UBES. A atuação militante pela democratização e avanços políticos nas bases e nas direções tem que ser fortalecida pelas representações nacionais e até internacionais. Mais do que mero aparato de forças políticas, estas entidades fazem sentido enquanto instrumentos de apoio às bandeiras específicas e gerais da classe trabalhadora e direcionamento das lutas da juventude pela educação crítica, de qualidade e transformadora.


D) Juventudes e Diversidade

40. Apesar da centralidade e importância histórica do Movimento Estudantil, é fato que este não é o único espaço de incidência da juventude. Existem inúmeros outros movimentos mais ou menos politizados que agregam jovens: direitos humanos, da criança e do adolescente, pastorais sociais e grupos religiosos, esportivos ou culturais (bandas, agremiações e blocos, folclore tradicional, hip hop, turmas de grafite, malabares, etc). Além disso, os jovens desenvolvem forte participação na composição de movimentos ambientalistas, étnico raciais, feministas, LGBTT, popular e sindical, etc. Seria exaustivo citar todas as formas organizativas que a juventude se insere e dá o tom. Mesmo que muitas vezes se dilua e não se reconheça enquanto força de juventude.

41. Nos dias atuais registra-se também uma ampla adesão da juventude à internet e à realidade virtual. Os(as) jovens compõem a ampla maioria de usuários(as) de computadores em rede no Brasil e no mundo. Para além de seu caráter de entretenimento e alienação consumista, a internet pode ser direcionada para potencializar seu viés emancipatório. Na medida em que permite a ampla socialização de informações e conhecimentos, incide na opinião pública, funciona como instrumento mobilizador das manifestações e subverte a ordem constituída.

42. Por isso, faz muito mais sentido se falar em “juventudes” e não em uma expressão única homogênea. Mesmo assim não se pode perder a dimensão do corte classista que permeia toda estrutura social. A juventude proletária, além do seu papel na esfera produtiva, é formada pelos(as) filhos(as) da classe trabalhadora. E assim como na análise marxista clássica, cabe a ela tomar parte na superação da divisão social do trabalho e da própria macroestrutura econômica e superestrutura político ideológica capitalistas, por meio de seu reconhecimento de classe em si e para si, com consciência (projeto histórico) e organização (lutas e combatividade).

Coletivo de Base da Juventude Marxista

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